Enquanto passava minhas compras no caixa do mercadinho da minha cidade no interior, resolvi dar uma olhada na estante de livros ao lado e me deparei com o verde fluorescente da capa do livro "A biblioteca da meia-noite" que me chamou muito a atenção.
Li o breve resumo da contracapa e resolvi comprar - não por acaso - eu precisava muito ler esse livro, só que até então não sabia disso. O Universo simplesmente me guiou até ele e eu vou resenhar a história para vocês aqui, transmitindo as minhas impressões e aprendizados.
Nora Seed era uma mulher de 35 anos que colecionava desistências e fracassos na vida, apesar de todo seu talento em várias áreas. Era exímia nadadora na adolescência, tendo vencido algumas competições. Ainda jovem, aprendeu a tocar teclado sozinha e participou de uma banda com irmão, para a qual compôs inspiradoras canções. Cursou faculdade de filosofia e amava o filósofo Henry David Thoreau, grande expoente da filosofia transcendentalista (até comprei o livro Walden de sua autoria e pretendo trazer em breve a resenha dele).
No entanto, sua vida atual era um retrato da mediocridade. Nora trabalhava em uma loja de instrumentos musicais, estava solteira e morava sozinha com seu gato Voltaire em uma casinha de aluguel. Não tinha amigos próximos - sua melhor amiga Izzy tinha se mudado para a Austrália e elas pouco se falavam - e também não conversava com o irmão, que se revoltou com ela após o termino da banda que tinham "The Labyrinths". Seu ex-noivo, Dan, de quem ela se separou dias antes do casamento, a sondava as vezes, mais por obsessão do que por sentimento verdadeiro. Seus pais haviam falecido e os únicos contatos humanos que ainda possuía eram seu aluno de piano Leo, seu vizinho idoso, o Sr Banerjee e seu patrão, o dono da loja de música.
Então, um belo dia, após uma longa jornada de trabalho, Nora se despediu do chefe que sem titubear a demitiu, alegando que a loja andava mal das pernas e que por ser portadora de um currículo invejável, ela estava muito acomodada e deveria dar um novo rumo para sua vida.
Chegando em casa, após entornar uma garrafa de vinho, recebeu a inesperada visita de Ash. O rapaz era um médico, cliente de sua loja e havia decidido chamá-la pois encontrara se gato Voltaire morto no meio fio. A partir daí, Nora desaba em prantos e passa a se questionar a respeito do sentido de sua existência: se ela não era nem capaz de cuidar de um gato e, após acumular tantos fracassos, para o que mais serviria?
Foi então que tomou a fatídica decisão de se suicidar.
Nora acordou em um local estranho. Sob uma névoa densa conseguiu enxergar um prédio, com um relógio marcando a meia-noite. Ao entrar no edifício se viu diante de uma biblioteca que possuía infinitos corredores e prateleiras, contendo livros verdes de todas as nuances possíveis.
Para recebê-la apareceu a Sra Elm, uma bibliotecária que a havia ajudado muito em seus tempos de escola, sobretudo quanto ao falecimento de seu pai, que tinha sido um momento muito delicado em sua vida.
Então, a Sra Elm explica o significado de Nora estar ali - em sua vida raiz, a moça estava entre a vida e a morte e, na Biblioteca da meia-noite teria a derradeira oportunidade de confrontar seus arrependimentos - através da leitura do "Livro cinza dos arrependimentos" e escolher novas possibilidades de vidas - através da leitura dos livros verdes, contendo diversas opções de caminhos a seguir com base em suas reconsiderações sobre sua vida raiz.
A saga de Nora começa e seus arrependimentos são expostos durante sua leitura do livro cinza: por que havia abandonado a natação, já que tinha potencial? Por que tinha se separado de Dan, antes do casamento? Por que tinha desistido da banda "Labyrinths" com o irmão?
Ao escolher as vidas que gostaria de experimentar, Nora recebe o livro verde correspondente àquela existência e como num passe de mágica durante a leitura, se vê na respectiva vida. Conforme vai experimentando cada uma, assim que percebe o ressoar de uma melancolia dentro de si, de imediato volta para a biblioteca. A explicação que a Sra Elm dá para esse fenômeno é a de que Nora só permanecerá dentro da "vida" em que se sentir verdadeiramente feliz, ou seja, plenamente satisfeita com ela.
Mas isso não acontece. Vida após vida e a tristeza só cresce.
Por fim ela compreende que, no fundo, aquelas existências estavam de acordo com padrões do que os outros desejam para a vida dela: o pai queria que ela fosse nadadora olímpica, Dan queria que eles se casassem, a viagem para a Austrália era um sonho de Izzy e a banda, era um desejo de seu irmão.
Outras vidas são experienciadas, dessa vez de acordo com seus próprios padrões. Mas Nora finalmente compreende que existia um sentido mais profundo em sua vida raiz. Inconscientemente ela deseja retornar e sobreviver da tentativa de suicídio.
Não pretendo dar spoilers. Então não me aprofundarei tanto na história em si.
Mas gostaria de trazer alguns pontos para reflexão, pois essa narrativa nos desperta essa necessidade.
Nora evidentemente cresceu em uma família tóxica, com um pai narcisista, para mim isso fica claro durante a leitura. Isso contribuiu para que ela se tornasse extremamente insegura de si, sem um senso de identidade próprio. Pessoas que crescem com pais controladores tendem a ter uma autoestima muito baixa e se tornam adultos cheios de culpa e ressentimentos, sobretudo por que acreditam que vivem para atender as expectativas dos outros.
Ao longo de sua jornada na "Biblioteca da meia-noite" Nora compreende isso de maneira inconsciente e por isso retorna a sua vida raiz, pois enfim entende que há um sentido maior nela, afinal além de ser um ser humano empático, suas pequenas atitudes do dia-a-dia reverberam nas vidas das pessoas simples de seu convívio e contribuem de maneira positiva para elas.
Conclui então que, tanto faz ser uma campeã olímpica, uma estrela do rock, ou uma funcionária de loja de discos, o que importa no final é o bem que fazemos para o próximo e o impacto que tantas pequenas ações gera na sociedade.
Filhos de narcisistas sofrem com as expectativas grandiosas dos pais, e quando não as atingem se sentem extremamente frustrados, como se não tivessem o direito de viver.
Refletir é necessário!
Boa leitura!!!